07 julho 2020

HISTÓRIAS DIFERENTES - NO MESMO LUGAR

Quando Marta saiu de casa naquela manhã, estava disposta a terminar o relacionamento com Charles, devido ao fato de que ele era ciumento ao extremo. Marta sempre foi guerreira, trabalhava em dois empregos e aos finais de semana ainda procurava alguns bicos para garantir o sustento dela e dos três filhos. Era uma mulher muito responsável, mas tinha certas atitudes que deixava Charles pensar que ela o traia. Paralelamente a essa história, no terceiro andar do Shopping Estrela do Mar funcionava aquele pequeno restaurante. A praça de alimentação estava sempre lotada no horário de almoço, nos dias de semana e também aos finais de semana. Uma equipe de uma empresa contratada pelo Shopping estava fazendo a manutenção preventiva e rotineira do sistema de gás que alimentava todos os restaurantes da praça de alimentação. Um pouco distante, pelo menos a três quarteirões, morava Pedro Henrique, um garoto rebelde que não gostava de frequentar a escola e ainda, aos vinte anos de idade não queria saber de trabalhar. Quando Marta saiu de casa pela manhã, Charles fingiu que estava dormindo, pois afinal, ele trabalhava como segurança no Shopping Estrela do Mar e seu horário de trabalho iniciava-se pouco antes do horário do almoço. Para uma mulher casada, mãe de três filhos, as roupas que Marta vestia não eram condizentes com uma mulher respeitada e séria, pelo menos na opinião de Charles. Marta saiu de casa usando vestido transparente, salto alto e toda maquiada. Charles nunca aprovou o jeito de se vestir de Marta e isso foi o motivo de tantas brigas. O casamento deles estava por um fio e o que segurava a decisão de terminarem foram os filhos. Antes de deslocar ao trabalho, Charles foi até o trabalho de Marta, na loja de calçados e dizia querer ter uma conversa com Marta.
          Marta relutou e disse que poderiam conversar à noite, quando estariam em casa. Charles não aceitou a proposta de Marta e para que ele não fizesse um escândalo em seu ambiente de trabalho, resolveu se encontrar com Charles na praça da alimentação num prazo de uma hora. E assim ficou combinado. Assim que Charles se afastou da loja de calçados, foi possível ver três homens com uniformes da empresa de manutenção de gás saírem do Shopping. Quando Charles foi para seu posto como segurança, disse ao amigo que iria render:
          - Você também está sentindo cheiro de gás?
          O amigo disse não e assim Charles continuou no posto esperando o amigo Samuel sair para o almoço e quando voltasse, Charles daria uma escapadinha para conversar com Marta. Há poucos metros dali estava Pedro Henrique, garoto rebelde, que havia brigado com a mãe e fora até o Shopping se encontrar com a namorada. Simone já o aguardava e Pedro Henrique sentou-se com Simone bem próximo à praça de alimentação e ficaram conversando. Na praça de alimentação os comentários sobre o cheiro forte de gás começaram a ser mais frequentes. Algumas pessoas comunicaram a segurança e os donos dos restaurantes. A praça de alimentação estava lotada e isso causou um retardo numa averiguação mais rápida por parte dos bombeiros de plantão no Shopping. - Eu quero a separação? Disse Marta, de supetão, logo que se encontrou com Charles. Charles argumentou, discutiu em voz alta e fez que muitos que estavam por perto percebessem. Marta se levantou e caminhou em direção ao seu local de trabalho. Charles foi atrás e ameaçou reação mais tempestiva quando surgiu Samuel e o conteve:
          - Calma Charles, calma!
         O amigo de Charles, Samuel, chegou no momento certo. Talvez, se não, Charles poderia ter cometido algo de pior em relação à Marta. Samuel caminhou em direção à saída do Shopping. Achou que seria melhor tirar Charles daquele ambiente até que esfriasse a cabeça. Próximo dali, num banco da praça de alimentação, Simone dava conselhos a Pedro Henrique sobre os problemas de relacionamento com sua mãe. Simone, apesar de ter a mesma idade de Pedro Henrique, era mais madura, mais vivida, sabia o que queria da vida, enquanto que Pedro não queria saber de trabalhar, nem de estudar:
          - Querido preciso ir, tenho aula de Inglês à tarde.
          Pedro Henrique pediu se Simone poderia passar a tarde com ele. Estava inseguro, queria ter uma conversa séria com a mãe, queria mudar suas atitudes e pediu ajuda para Simone. Simone achou que era a chance que tinha para de uma vez, fazer com que Pedro Henrique se acertasse na vida.
          - Está bem querido, eu fico com você. Vamos comer alguma coisa, depois vamos conversar com sua mãeSimone estava na porta de saída do Shopping, quando foi convencida por Pedro Henrique em ficar. No mesmo instante em que Simone estava voltando para dentro do Shopping, Charles estava saindo, amparado por seu amigo Samuel e Marta voltando para a loja de calçados para retomar seu trabalho. Charles e Samuel já tinham caminhado certa de cento e cinquenta metros distante da porta de entrada do Shopping quando se ouviu uma grande explosão: - Meu Deus! A explosão foi tão forte que fez desabar vários telhados das casas que estavam bem próximas ao Shopping. Uma poeira gigantesca subiu aos céus. O andar onde se encontrava a praça de alimentação ficou resumido em pedaços de concreto e poeira. As equipes da RESCUER e dos Bombeiros foram acionadas em caráter de urgência e emergência e toda área foi evacuada e isolada pela polícia:
          - O terceiro andar está totalmente destruído!
          - Quantas pessoas? Quantas pessoas?
          - Duzentas e cinquenta! Talvez trezentas!
Os rádios de comunicação da polícia, dos bombeiros e da RESCUER a todo o momento atualizavam as informações. As equipes de rádio e TV ficavam num área de segurança para que não fossem atrapalhados os trabalhos de resgates e salvamentos: - Atenção todas as unidades! Acionem a polícia! Vamos precisar de cães farejadores! Nesta ocorrência várias equipes da RESCUER foram deslocadas para o Shopping Estrela do Mar e em uma das ambulâncias estava o Dr. Abreu. As equipes dos bombeiros iam abrindo caminho entre os escombros em busca de sobreviventes. - Doutora! Doutora! Aqui! Gritava um dos bombeiros para a Dra. Maria Julia. Um jovem rapaz, cheio de fraturas por todo o corpo, gritando de dor. A dor era tamanha e entre pedaços de concretos e poeira a equipe da RESCUER liderada pela Dra. Maria Julia tentava de todas as maneiras amenizar o sofrimento do rapaz: - Ela está morta! Ela está morta! Simone está morta! Por favor, me matem, não suporto tanta dor! Eu quero morrer logo... Morrer logo!
          O jovem Pedro Henrique estava morrendo e delirava nos braços da Dra. Maria Julia. Não havia mais nada a fazer e assim como essa várias outras cenas de sofrimento em meio a tanta tragédia. Os cães farejadores foram de uma importância tamanha nos trabalhos de rescaldo e o número de vítimas fatais atingiam números superiores a duzentos. - Eu preciso entrar! Eu preciso entrar!
        Aos gritos, Charles queria de toda maneira entrar no que restou do Shopping. Chamando por Marta, foi contido pelos bombeiros que o afastaram de uma zona critica, pois havia risco de queda das vigas que sustentavam o teto e as paredes laterais. Maria ficou sendo assistida por uma equipe da RESCUER, mantendo os olhos arregalados, às vezes piscando, olhando para um lado e para outro procurando por alguém, não dizendo uma só palavra. Dr. Abreu viu que a situação ficou grave, uma de suas pernas estavam esmagadas, os braços mutilados, mas Marta não expressava a tamanha dor, não estava morta, respirava normalmente e apenas mudou de expressão facial quando viu Charles:
          - Estava esperando você chegar. Resisti até esse momento te esperando. Existem vários anjos ao meu redor e eles sopram minhas feridas, aliviando a minha dor. A luz ofusca meus olhos, mas ainda consigo ver tudo ao meu redor.
          Antes que a luz se apague e Deus venha me abraçar queria te dizer que te amo e que sempre vou te amar, na eternidade!
          Essas foram as últimas palavras de Marta e aos gritos Charles se desesperou, ao mesmo tempo em que a equipe da RESCUER retirava o corpo de Marta naquela região crítica, entre os escombros, que prenunciava queda das paredes que rodeavam aquele cenário de terror.

Antonio Auggusto João