Fazia um
tempão que Jair não passava um final de semana sozinho, sem a esposa e o casal
de filhos. Trabalhador, pai dedicado e marido exemplar, Jair não poderia passar
o final de semana com a esposa e os filhos, pois daria plantão no sábado e
domingo em seu trabalho. Aproveitando, sua esposa e filhos
resolveram ir para uma cidade do interior, distante duzentos quilômetros,
visitar os pais e parentes. Jair trabalhava como enfermeiro chefe de um grande
hospital e sempre foi muito responsável. - Tchau
querida! Tchau crianças! Boa viagem! Jair se
despediu da família na sexta feira à noite. Depois foi logo dormir, pois tinha
que chegar ao hospital no dia seguinte às seis horas da manhã para a troca da
equipe. Logo que chegou ao hospital pela manhã o
clima estava pesado. Com o pronto socorro superlotado as equipes médicas com
auxílio dos enfermeiros enfrentavam vários casos urgentes, comuns no dia a dia
e principalmente nas madrugadas de sexta para sábado. Maria Helena era a auxiliar de Jair. Eles
se davam muito bem na distribuição das tarefas, no auxílio aos médicos e
acompanhamento dos pacientes. Jair dizia que Maria Helena era seu braço
direito, fundamental para o sucesso, por assim dizer, no trabalho que eles
executavam. Todos sabiam que Maria Helena tinha uma
queda por Jair, mas Jair era um homem sério, bem casado, pai de dois filhos e
Maria Helena respeitava essa condição, mas não deixava de confidenciar a alguns
colegas que era perdidamente apaixonada por Jair. Maria Helena era uma mulher muito bonita,
respeitadora, constantemente cantada por muitos homens, mas seu verdadeiro amor
sempre foi Jair, que infelizmente para ela, muito bem casado. O sábado passou e no final do expediente,
depois de doze horas ininterruptas, a equipe de Jair fez um balanço do dia:
Foram treze salvamentos e dois óbitos. No
dia a dia nos entristecemos com as mortes, mas vibramos quando conseguimos
salvar uma vida. Salvar uma vida vale muito mais que se entristecer por uma
morte, conceituada, evidentemente, Jair. Maria Helena foi ao vestiário do hospital para se trocar. Quando
voltou encarou Jair como se fosse um anjo loiro de olhos azuis. Jair balançou e
Maria Helena percebeu. Ela sempre foi uma mulher muito bonita e se surpreendeu
quando Jair lhe fez uma proposta: - Se
quiser podemos jantar juntos essa noite! Maria Helena
nem pensou para dizer sim. Não poderia perder aquela oportunidade de ficar
alguns momentos com o grande amor de sua vida. Jair achou que não havia nada de
mais em convidar Maria Helena para jantar, pois afinal, eram colegas de
trabalho e na cabeça dele não havia segundas intenções, aparentemente. Os dois foram a um restaurante bem perto do
hospital e durante o jantar resolveram não falar sobre trabalho, sobre vida ou
morte e Maria Helena se encantou quando Jair disse que ela era muito bonita. - Uma
coisa era observar Maria Helena no estresse do trabalho e outra era estar
diante de seus olhos, sem o barulho das sirenes e dos autofalantes das
emergências. O jantar transcorreu de maneira muito
agradável. Maria Helena
percebeu que Jair estava vidrado e usou de sedução, palavras pausadas com sua
voz rouca. Uma taça de vinho foi suficiente para relaxar, ficarem mais a
vontade. Depois da terceira taça, estavam dançando
de rosto colado ao som de músicas românticas cantadas com acompanhamento de um
piano. De corpos entrelaçados e com a doçura de um perfume sedutor, não demorou
muito para se beijarem e se abraçarem com garras de paixão. Ao final da noite
estavam abraçados numa cama de motel. O domingo passou numa rotina normal de
trabalho. Jair e Maria Helena
trabalharam normalmente nada foi comentado sobre a noite de amor. Na cabeça de
Jair tinha sido uma aventura, um momento de prazer entre duas pessoas que se
gostavam, mas sem compromisso e tudo teria terminado na manhã seguinte, quando
os dois regressaram ao trabalho. Porém, na cabeça de Maria Helena, aquela
aventura tornou-se um sonho real, alimentou uma paixão avassaladora, pois os
dois se abraçaram, se beijaram e fizeram amor com intensidade de quem se ama.
Na noite de domingo Jair saiu assim que encerrou o plantão. Queria voltar logo para casa para
reencontrar a esposa e filhos que voltavam de viagem. Não se despediu de ninguém, saiu muito
depressa e quando Maria Helena percebeu Jair tinha ido embora. Jair chegou em
casa e passou o resto da noite com a mulher e os filhos. Estava feliz, pois no
dia seguinte seria sua folga no hospital e combinou de passear com a família.
Tarde da noite, após as crianças irem dormir, Jair ficou um bom tempo
conversando com sua esposa antes de dormir. No meio da noite, acordou com cede
e foi beber água. Quando voltou viu seu celular de luz acesa e foi verificar.
Jair se assustou. Haviam vinte e duas chamadas perdidas em seu celular e as
chamadas foram feitas por Maria Helena. Jair apagou as ligações e as mensagens e
percebeu a enrascada que se meteu depois da noite com Maria Helena. Quando
retornou ao trabalho, chamou Maria Helena para uma conversa e perguntou sobre
as ligações. Maria Helena disse que
estava sentindo sua falta e que a noite que tiveram juntos teve um significado
muito importante para ela: Estava apaixonada. Jair tentou convencê-la de que o
que tiveram foi uma aventura e que tudo havia terminado na manhã seguinte, era
um homem casado e não poderia ter um romance com ela. Ponderou ainda que o que
tiveram foi uma caso passageiro, uma atração meteórica que culminou numa noite
de amor. Maria Helena chorou muito e depois de uma longa conversa prometeu
esquecer, prometeu que Jair ficaria guardado em seu coração, mas que
respeitaria sua condição de homem casado. Alguns dias se passaram e Jair pensou
que tudo estava resolvido. Os telefonemas se cessaram e no ambiente de
trabalho ficou tudo normal. Maria Helena parecia que tinha se convencido de que
o acontecido tinha sido uma aventura que começou numa noite, como bons amigos,
numa mesa à luz de velas e terminou na manhã seguinte, numa cama de motel. Perto de completar mais um aniversário Jair estava muito feliz.
Sua esposa prometeu que faria um jantar com seu prato preferido e alguns
familiares compareceriam em sua casa. Por outro lado, Maria Helena voltou a
insistir: Queria uma nova noite de amor como a que tiveram, mas Jair demoveu-a
da ideia. - Você
precisa entender de uma vez por todas que eu sou um homem casado. Amo a minha
esposa e os meus filhos e o que aconteceu conosco foi um deslize de minha
parte. Nunca dei a você qualquer esperança, tampouco lhe prometi alguma coisa.
Vamos esquecer tudo, pois afinal ainda somos amigos, trabalhamos juntos e não
podemos deixar nada transparecer em nosso ambiente de trabalho.
Contemporizou Jair. O dia do aniversário de Jair chegou e a equipe de trabalho
preparou um bolo e cantaram parabéns a você! Jair agradeceu, recebeu os
comprimentos de todos e ao final do expediente se despediu emocionando:
- Minha
família está me esperando! Obrigado a todos! Jair voltou
para casa ansioso pela comemoração de seu aniversário com seus familiares. Tudo estava perfeito em seu dia e ele
estava muito feliz. Antes de servirem o jantar, uma surpresa: Uma visita até
certo ponto inesperada. Enquanto Jair brindava com sua família e
amigos, tocou a campainha e sua esposa foi atender: - Maria
Helena! Querido! Olha quem chegou! Jair ficou
com cara de poucos amigos. Não tinha convidado Maria Helena para o jantar,
porém, não poderia deixar transparecer qualquer atitude inconveniente e acabou
por receber Maria Helena à mesa. Sua esposa achou normal, pois Maria Helena era
sua conhecida e sabia que trabalhava com o marido. Um pouco alegre pelas
bebidas que havia consumido Jair não sabia o que dizer:- Veja
querido quem chegou! Sua colega de trabalho! Para a
esposa de Jair a situação, ou seja, a presença de Maria Helena em sua casa era
normal, pois afinal, sua esposa sabia que ela era uma boa colega de trabalho de
seu marido. Jair ficou constrangido e não sabia o que fazer diante daquela
surpresa. Entretanto, procurou agir com a maior naturalidade possível, mas a
situação começou a ficar preocupante, pois Maria Helena não lhe desviava os
olhos e tudo aquilo poderia ser uma bomba relógio que explodiria a qualquer
momento. E todos se sentaram à mesa para que fosse
servido o jantar. Maria Helena, um tanto quanto deslocada não se intimidou e
ficou conversando com Sofia de cinco anos, filha de Jair. Jair e sua esposa
ficaram o tempo todo conversando com os convidados. O jantar foi bem sucedido,
todos ficaram satisfeitos e o casal começou a se despedir dos convidados, um a
um, até que ao final notaram que Maria Helena havia ido embora sem de despedir. De certo modo, Jair ficou aliviado, apesar
da desconfiança de sua esposa quanto a Maria Helena. E enquanto se despedia do
último convidado, ouviu-se um grito desesperador de Samanta, esposa de Jair: - Sofia!
Sofia! Sofia não estava em casa, não estava no
quarto, no quintal, em nenhuma dependência da casa. Jair não acreditou e
percorreu a casa inteira feito um louco à procura da filha. Ligaram para todos
os parentes e amigos e nada de saberem onde estava Sofia. Por fim, houve-se uma
interpelação de Samanta: - Ela
ficou o tempo todo com Maria Helena. Só pode ter sido ela. Jair,
desesperado, ligava ininterruptamente para Maria Helena, mas só entrava na
caixa postal. Enquanto isso Samanta ligou para a polícia e logo se fez um
alerta com o retrato identificado de Maria Helena e da criança. Enquanto isso
Jair era interrogado por Samanta e acabou contando para a esposa o envolvimento
extraconjugal que havia tido com Maria Helena e que talvez, pela indiferença
dele, o sequestro de Sofia poderia ser uma represália. Samanta não questionou Jair em nenhum
momento sobre seu envolvimento com Maria Helena, pois, de certo, o sequestro da
filha deixou-a fora de órbita, o que não fez com que ela digerisse a revelação
do marido. A noite inteira se passou e a polícia não tinha nenhuma pista,
além de que o envolvimento de Maria Helena no sequestro de Sofia ainda era uma
suspeita que precisava ser comprovada. A situação estava insustentável.Tentando entender a realidade dos fatos,
Jair foi confessar ao delegado do caso o motivo de sua suspeita. Além do amor louco que Maria Helena tinha por
Jair, o maior sonho era que tivessem uma filha, porém, Maria Helena sabia que
nunca poderia ser mãe e toda sua loucura poderia ter feito com que tivesse
sequestrado Sofia. O dia amanheceu e a polícia começou a
investigar as denúncias que recebia, até que um telefonema delatava que uma
mulher e uma criança com as características de Maria Helena e Sofia foram
vistas no parque central da cidade. Foi num feriado, um dia bonito de sol e o
parque estava cheio.
Pessoas andando de bicicleta, fazendo
exercícios, praticando esportes ou tomando sol na beira do lago, enfeitavam o
lindo dia. Ao fundo do parque existiam algumas cabanas
onde as famílias utilizavam para fazer piquenique e quando a polícia chegou,
acompanhada de Samanta e Jair, encontraram Sofia, sozinha, brincando com outras
meninas que havia conhecido no parque: - A
tia Helena foi comprar comida! Ela disse que você iria chegar mamãe! Disse
a criança inocente. Enquanto seus pais choravam e abraçavam
Sofia, a polícia seguia alguns rastros que poderiam leva-los até Maria Helena.
Sofia estava bem, disse aos pais que havia dormido no carro e que a tia Helena
havia prometido trazê-la no parque para comerem algodão doce. Enquanto isso
Maria Helena percebia que estava cercada e fugiu dirigindo seu carro em alta
velocidade. Sofia voltou com Samanta para casa sã e
salva, enquanto Jair foi com a polícia em perseguição a Maria Helena. A polícia
estava no encalço e dificilmente Maria Helena iria escapar. Jair tentava a todo
o momento manter contato, mas Maria Helena estava perturbada. - Não
atirem! Não atirem! Ela não fez por mal! Jair ficou desesperado. Sabia que Maria
Helena estava muito perturbada e aquele estado de loucura poderia ser
revertido. Quando finalmente a polícia fechou o carro, Maria Helena fez uma
manobra suicida e o carro capotou por várias vezes. Jair saiu em disparada para
socorrer Maria Helena, que ficou presa entre os ferros retorcidos do carro
destruído. - Cuidado!
O carro pode explodir! Alertou o policial. E entre os
escombros e um coração partido, Maria Helena, num olhar profundo, lamentou
dizendo: - Eu
não maltratei a nossa filha! Maria Helena
se recuperou depois de quase trinta dias internada. Jair não deixou de cuidá-la
um só momento e quando teve alta foi levada para um hospital psiquiátrico onde
pagou sua pena. Quanto a Jair, foi perdoado por Samanta e se transferiu de
hospital.
ANTONIO AUGGUSTO JOÃO
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